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De onde esse cheiro vem???

Muitas vezes ouvem-se as pessoas associarem o nome gambá a um animal listrado de branco, que libera um odor forte que fica impregnado onde respingar. Porém, este animal não é um gambá e sim um pequeno carnívoro popularmente conhecido nos pampas gaúchos como zorrilho. O gambá verdadeiro é um marsupial (mamíferos que carregam seus filhotes em uma bolsa chamada marsúpio). No Rio Grande do Sul a espécie mais comum é o gambá-de-orelha-branca (Didelphis albiventris), que às vezes aparece até em ambiente urbano para se alimentar de restos de comida.

Já o zorrilho (Conepatus chinga), um dos menores carnívoros do Rio Grande do Sul, é parente mais próximo do furão e da lontra do que dos gambás verdadeiros. Pesa em torno de 1 a 2 kg, possui patas curtas, cauda volumosa e garras adaptadas para escavar. Seu pelo varia de preto a marrom escuro, com duas faixas brancas nas laterais do corpo, que podem estender-se até a cauda. Porém a extensão desta listra é muito variável podendo terminar pela metade do corpo ou mesmo estarem ausentes, deixando o animal todo negro.

Não confunda o gambá (foto da esquerda) com o zorrilho (foto da direita).

Muito ligado a ambientes abertos, costuma andar solitário à noite a procura de alimento. A dieta do zorrilho consiste basicamente de larvas, insetos e pequenos vertebrados. Os hábitos destes animais são quase exclusivamente noturnos, com atividades iniciadas logo após o pôr do sol e encerradas antes do dia raiar. Como abrigo, costumam utilizar tocas abandonadas por outros animais (principalmente de tatus), além de troncos secos, construções humanas ou bambuzais. Também se escondem em meio à vegetação, sobretudo em locais espinhentos como debaixo de gravatás.

Porém, uma característica chama mais atenção e torna esta espécie peculiar: seu mecanismo de defesa. Possuidor de um par de glândulas ao redor do ânus, que secretam um muco de odor extremamente forte. Estas glândulas estão rodeadas por músculos, capazes de fazer com que este muco seja esguichado até dois metros de distância! Com esta defesa o zorrilho consegue colocar quase qualquer predador que se meter com ele para correr!

A essência da defesa

Normalmente, quando o zorrilho está à procura de comida, caminha em trote curto, com sua cauda mantida em linha reta. Quando perturbado ele eriça o pelo do corpo e da cauda. Porém, o zorrilho só usa sua “arma de defesa” quando se sente muito acuado ou quando é atacado diretamente. Quando cachorros chegam próximo, ele se defende prontamente, por exemplo. Mas com humanos o zorrilho é muito mais tolerante! O primeiro comportamento é sempre a fuga. Porém, é comum o zorrilho “encarar” quando se sente ameaçado. Quando resolve enfrentar ele avança em direção a pessoa batendo as patas no chão e emitindo um som sibilado.

Quando utiliza suas glândulas, o zorrilho esguicha finos jatos, a distâncias de até 2 metros. O odor é tão forte que sobrecarrega temporariamente o olfato do predador permitindo que o zorrilho fuja. Este cheiro é tão forte que uma roupa eventualmente atingida dificilmente consiga se livrar do cheiro.

As glândulas odoríferas perianais dos zorrilhos são glândulas de suor modificadas. Essas glândulas produzem odores em muitos mamíferos, incluindo o ser humano. As glândulas dos zorrilhos trabalham continuamente produzindo uma substância, que é armazenada, e vai sendo liberada pelo animal em pequenas quantidades por vez. As glândulas se localizam na base da cauda, sendo ligadas a músculos que são controlados por conexões nervosas com o cérebro. A decisão de liberar é consciente, através da contração dos músculos que forçam a liberação do líquido.

Localização das glândulas odoríferas em um zorrilho. Imagem modificada de: http://www.vcahospitals.com/main/pet-health-information/article/animal-health/skunk-spray-and-your-dog/2139

Não é xixi!

Ao contrário do que é dito popularmente, o líquido usado pelo zorrilho na sua defesa não é urina! Como dito, são secreções de uma glândula. Esta secreção já começa a ser produzida com seis semanas de idade, quando as glândulas começam a produzir um líquido formado por compostos de enxofre, chamados tiois, bem como ésteres associados, chamados tioacetatos. Os tiois voláteis produzem o odor imediato, enquanto que os ésteres permanecem na superfície do que for esguichado. Quando os acetatos entram em contato com água liberam os tiois voláteis. Isso resulta no odor persistente tão famoso.

Proteja o zorrilho!

O zorrilho pode ser considerado um mamífero característico dos campos gaúchos. Normalmente é bem quisto e respeitado pelos homens de lidas campeiras, onde é tido como animal útil, devido ao habito de predação a insetos e serpentes. Porém, a espécie continua a ser caçada na Argentina para o comércio de peles ou como souvenires. No Rio Grande do Sul alguns animais ainda são mortos por pequenos produtores rurais, como resposta a supostas perdas a pequenos animais de criação, sobretudo ovos, pintos e outras pequenas aves. Também é uma das principais espécies vítimas de atropelamentos nas rodovias que cortam o Pampa.

Essa espécie ocorre do Sul do Peru e oeste da Bolívia, ao centro e norte da Argentina e região central do Chile e Uruguai. No Brasil está restrito aos estados do Paraná, Santa Cantarina e Rio Grande do Sul. Os zorrilhos são parte importante do ambiente, sendo um componente fascinante da nossa biodiversidade e seus benefícios superam qualquer fator negativo que lhe é atribuído.

Fontes consultadas e sugestões de leitura

Kasper, C. B., da Cunha, F. P., & da Fontoura-Rodrigues, M. L. Avaliação do risco de extinção do zorrilho Conepatus chinga (Molina, 1782) no Brasil. Biodiversidade Brasileira, (1), 240-247. 2013.

SILVA, F. Mamíferos silvestres: Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Via sapiens; Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul. 3ed. 308p. 2014.

Skunk Spray and Your Dog. Disponível em: <http://www.vcahospitals.com/main/pet-health-information/article/animal-health/skunk-spray-and-your-dog/2139>. Último acesso em: 07/10/2016.

Texto

Raissa P. M. e Carlos Benhur Kasper

Laboratório de Biologia de Mamíferos e Aves

Universidade Federal do Pampa

Em 08/06/2017

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